15 de janeiro de 2008

A Petrobrás na selva peruana

O campo de gás Camisea foi descoberto na selva a oeste de Cusco, no Peru, em 1982. A Shell e a Exxon exploraram-no durante dois anos mas acabaram por abandoná-lo em 1998. Em dezembro de 2000 a companhia Pluspetrol, o terceiro maior grupo petrolífero da Argentina, ganhou a concessão para extrair gás natural da bacia de Camisea. Entretanto, a intenção de Pluspetrol de realizar operações sísmicas e de perfuração dentro da reserva estatal dos Nahua/Kugapakori deu início a uma controvérsia sobre os impactos potenciais que sofreriam os habitantes indígenas que vivem nessa zona em isolamento voluntário e/ou em etapas iniciais de interação direta com a sociedade nacional peruana. O Bloco 88 se superpõe à reserva dos Nahua/Kugapakori, estabelecida pelo Peru em 1990 para proteger aos grupos indígenas Nahua e Kugapakori (também conhecidos como Nanti) dos perigos do contato com a sociedade nacional. O grupo encabeçado por Pluspetrol também incluía à companhia estadounidense Hunt Oil e a corporação coreana SK.

A reserva dos Nahua/Kugapakori, com 443.887 hectáreas, é o lar ancestral dos povos Nahua, Nanti e Matsigenka. Ao mesmo tempo há alguns Nanti e outros povos de origem étnica não determinada que escolheram evitar todo contato direto com a sociedade nacional, exercendo seu direito de dizer não. Estes grupos são ainda mais vulneráveis às doenças introduzidas e vivem nas cabeceiras mais distantes dos rios Timpia, Serjali e Paquiria, incluída a área onde se realizam provas sísmicas. A análise independente da avaliação ambiental (EA) realizada por Pluspetrol concluiu "não ser possível assumir que o plano (de contingência) poderá evitar de forma efetiva os impactos prejudiciais, como a difusão de doenças introduzidas". De fato, quando a empresa Shell Oil realizou explorações preliminares na região nos anos 1980, mais da metade da população Nahua morreu como resultado de enfermidades respiratórias contraídas dos madereiros. A conclusão da análise independente foi: "não importa quantas precauções se tomem, a única política totalmente efetiva é evitar trabalhar em áreas que se sabe que estão habitadas por esses grupos".

A situação agravou-se em 2005 e 2006 com vários derrames de óleo na área, contaminando recursos das populações indígenas. Agora, depois de ano passado a Petrobrás já haver anunciado investimentos de 800 milhões de dólares para a construção de um pólo petroquímico no litoral peruano, se anuncia um grande achado no poço exploratório de Kinteroni X1 no chamado Bloco 57, e a hispano-argentina Repsol será a operadora do consórcio que explorará este campo, com participação de 41 por cento, enquanto que Petrobrás tem 35,15 por cento e a companhia local Burlington Resources Perú 23,85 por cento, participação esta última que Repsol e Petrobrás estão adquirindo, dependendo apenas da aprovação formal por parte das autoridades peruanas. É bom lembrar que em setembro de 2007 Repsol ganhou licitação pública internacional para o fornecimento de gás natural (GNL) proveniente da jazida de Camisea para o terminal de gás natural no porto de Manzanillo, nas costas mexicanas do Pacífico. O contrato, com duração de 15 anos e um valor estimado de 15 bilhões de dólares ou 11 bilhões de euros, contempla o fornecimento de 67,5 bilhões de metros cúbicos (bcm), equivalentes a mais do dobro do consumo anual da Espanha (!).
.

O consórcio "Proyecto Camisea" mantém em seu website a "Declaración de los Pueblos Indígenas Matsiguengas y Yine Yami del Bajo Urubamba y Bases de CONAP", de outubro de 2003, buscando comprovar estar cumprindo com a legislação internacional. Segundo eles, associações indígenas locais, regionais e nacionais monitoram permanentemente as atividades em Camisea e publicam em suas páginas web informação sobre suas negociações com os consórcios e com o governo, suas preocupações e reclamações, dentre outros temas. Para maiores informações consultem:

  • COMARU, Consejo Machiguenga del Río Urubamba.
  • CECONAMA, Central de las Comunidades Nativas de Machiguenga.
  • ACPC, Asociación para la Conservación del Pueblo Cutivireni.
  • CEDIA, Centro para el Desarrollo del Indígena Amazónico.
  • FECONAVY, Federación de las Comunidades Nativas Yine Yami.
  • AIDESEP, Asociación Interétnica para Desarrollo de la Selva Peruana.
  • CONAP, Confederación de Nacionalidades Amazónicas de Perú.
  • CAAAP, Centro Amazónico de Antropología y Aplicación Práctica.
  • CIPA, Centro de Investigación y Promoción Amazónica.
  • IBC, Instituto del Bien Común.
  • INRENA, Instituto de Recursos Naturales.
  • DGFF, Dirección General Forestal.
  • ONREN, Oficina Nacional de Evaluación de Recursos Naturales.

  • As atividades em Camisea já estão causando problemas no Brasil, com o deslocamento de tribos (muitas delas desconhecidas) para território brasileiro, fugindo do contato com petroleiros e madeireiros, causando confronto em aldeias dos grupos indígenas do estado do Acre. Só podemos esperar que a Petrobrás, empresa brasileira, cumpra com a legislação internacional sobre o ambiente e direitos dos povos indígenas, evitando assim ações como a empetrada no Equador para expulsá-la de terras pertencentes a aldeias ancestrais.

    Fontes: Planet Ark , Libertad Digital e WRM - Movimiento Mundial por los Bosques Tropicales. Informações sobre o Camisea podem ser acessadas em Amazon Watch. Para obter mais informações sobre a reserva Nahua/Kugapakori e seus povos indígenas visite os sites Serjali e ONR.

    Leiam também: "O petróleo e o gás debaixo da terra Pan-Amazônica", de Oswaldo Sevá e Marcelo Piedrafita Iglesias, e "O Povo que planta Pedra", por José Carlos dos Reis Meirelles Jr. O informe "Un Análisis Ambiental y Social Independiente sobre el Proyecto del Gas de Camisea", encomendado pelo Consejo Machiguenga del Río Urubamba (COMARU) e a Asociación Interétnica de la Amazonía Peruana (AIDESEP), também está disponível, no site da Oxfam, em inglês e em espanhol.

    Nenhum comentário: