26 de novembro de 2009

Revelações (II)


O CULTO GAI’WIIO OU A BOA MENSAGEM DOS IROQUESES

“Handsome Lake nasceu por volta de 1735 de uma família Sêneca, do clã Lobo, numa aldeia próxima a Avon (Estado de Nova York), de onde em 1799 teve de fugir com toda a população para Tonawanda sob a pressão dos invasores brancos, os quais avançavam incendiando casas, campos e povoados. Handsome Lake era um dos chefes (sachem) seneca, que faziam parte do conselho (executivo, legislativo e judiciário) da Liga Iroquesa. (...) A revelação profética ocorreu pela primeira vez a Handsome Lake no dia 15 de junho de 1799. Há tempos ele vivia doente e sofrendo, na casa de Cornplanter [seu meio-irmão]. Já tinha abandonado qualquer esperança de sobreviver quando um dia caiu subitamente em transe e ouviu uma voz que o chamava de fora. Saiu de casa e avistou três figuras ou espíritos com forma humana que, apresentando-lhe alguns ramos e folhas frutíferas, convidaram-no a colher os frutos, com os quais seria curado milagrosamente. Eles o advertiram da parte do Grande Espírito, que deplorava profundamente a intemperança dos homens e sobretudo a embriaguez e o uso de álcool e uísque, a fim de que se fizesse divulgador da nova doutrina de salvação. (...)
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O profeta, reduzido já a condições físicas desesperadoras pela vida dissoluta que levara sistematicamente até então e pelo álcool, restabeleceu-se depois de ter recebido a prodigiosa revelação.
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Os três ‘anjos’ anunciavam o iminente aparecimento de um outro personagem, que se mantivera afastado anteriormente e os havia enviado na frente. De fato, numa visão subsequente apresentou-se ao profeta o Grande Espírito em pessoa, compadecido com os seus sofrimentos. Em estado de transe, viu Ganeoda’yo [nome indígena de Handsome Lake] vir ao seu encontro seu falecido filho e uma sobrinha também falecida, deplorando entre si a intemperança dos vivos. O Grande Espírito impôs-lhe o abandono do álcool (‘água de fogo’) e lhe transmitiu os preceitos da nova religião. Entre outras coisas, deviam-se abandonar várias danças e festas tradicionais profanas, mas não a Dança do Culto (Worship-Dance) que, segundo uma sucessão do calendário e de estações fixada pela tradição em relação aos trabalhos agrícolas, constituía o núcleo das festas religiosas mais importantes e significativas da cultura iroquesa. Entre essas festas locais as principais a manter na nova religião (e que constituíam assim o seu núcleo cultual) eram a festa do Ano Bom (ou festa do Cão Branco), caracterizada pelo sacrifício de um cachorro branco ao Grande Espírito, a festa dos Morangos, a festa ‘das Plumas’ ou da colheita do milho, com a Dança do Agradecimento dedicada ao Grande Espírito, a Terra, ao grande antepassado mítico Heno, aos antepassados da estirpe, às Três Irmãs e outras figuras míticas de tradição pagã; finalmente, a festa do ‘Grão Verde’, a do solstício de inverno além de ritos de cura. Trata-se de festas tradicionais de caráter religioso, unidas num grande ciclo cerimonial em relação com o ciclo dos trabalhos de cultivo (milho) e de colheita (morangos), ou com a exigência de curar doentes. A tais festas e à sua conservação aludem evidentemente os emblemas vegetais apresentados ao profeta, numa espécie de sincretismo quacre-pagão, pelos ‘anjos’ mensageiros do Grande Espírito. As cerimônias rituais do ciclo da Casa Comprida desenrolam-se perto do bosque. No culto recorre-se a objetos rituais tradicionais como wampum, matracas. Executam-se oferendas de tabaco e danças rituais com cantos segundo textos e modelos arcaicos.
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(...) O desenvolvimento da Nova religião iroquesa prossegue, depois da fundação, até os dias de hoje sem mudanças substanciais por parte dos sucessivos pregadores e profetas, sujeitos a visões e revelações. (...) Fato que poderia ser importante no destino do novo culto foi a declaração do Presidente Jefferson, o qual aprovou como eficaz e positiva a mensagem do profeta Handsome Lake. Os nativos viram nele portanto o profeta oficial e reconhecido. Quanto às relações entre nativos e brancos, segundo a revelação profética de Handsome Lake, os brancos devem ser acolhidos nos centros habitados pelos indígenas e os filhos destes podem ser instruídos pelos brancos (Quacres). Por outro lado, os indígenas podem e devem ter fé nos antigos costumes de vida.”

Fonte: LANTERNARI, Vittorio. “As Religiões dos Oprimidos – Um estudo dos modernos cultos messiânicos”. São Paulo: Perspectiva, 1974. Col. Debates, v.95. (págs 132 a 137). Visitem o site Oneida Nation

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