Estrelas e Unidades de Tempo
Toda a cosmografia Tupi no que se refere aos fenômenos cosmológicos era baseada na observação empírica das variações das estações, dos ventos, das chuvas, etc. As estrelas Urubu, Surã, Iapuicã e as constelações Simbiare-rajeiboare e Seichujurá, por exemplo, indicavam a vinda das chuvas.
.
A principal unidade de tempo dos Tupinambás eram as lunações. Por meio de lunações conseguiam uma unidade de tempo correspondente ao nosso mês. Thevet nos informa que as perguntas sobre a idade, os acontecimentos tribais, tudo era respondido por seu intermédio: - “há tantas luas eu nasci....”
.
A eficiência do sistema total de demarcação do tempo Tupinambá, pode ser apreciada em relação com o nosso. Abbeville, que fez tal comparações, chegou a conclusões interessantes:
.
1) O movimento do Sol de um trópico ao outro e vice-versa, dava-lhes uma noção de tempo correspondente ao ano europeu.
.
2) A delimitação das épocas de chuvas e de ventos ou do tempo dos cajus, dava-lhes uma noção de tempo correspondente ao mês europeu.
.
3) Os movimentos da estrela "seichu", que aparecia antes das chuvas para desaparecer em seguida, davam-lhes um conhecimento empírico do interstício, ou seja, do tempo decorrido de um ano a outro.
.
4) Pela correlação entre as fases da lua e dos movimentos das águas, obtinham uma nova noção de tempo.
Para exemplificar toda esta teoria, escolhemos um sacrifício ritual, onde pode-se visualizar mais facilmente a regularidade destes fenômenos naturais.
.
O prisioneiro deveria ser conservado com vida por algum tempo. Neste caso, precisavam determinar a data da execução em quatro ou cinco luas, "verbi-gratia". Colocavam então, em seu pescoço um colar constituído com um número correspondente de certos frutos redondos. Outras vezes, o número de luas era computado por intermédio de pequenos colares, também colocados no pescoço do prisioneiro. Cada lua que passava tiravam uma conta do colar ou um pequeno colar do pescoço. Quando chegavam a última unidade, o prisioneiro deveria ser executado e todos os preparativos fundamentais para as festas e cerimônias se achavam prontos.
.
A guerra contra seus inimigos também eram marcadas com antecedência regular. Neste caso, podiam referir-se a certo número de luas. Mas se utilizavam também de outro processo. Como era conhecida a época da colheita de certos produtos agrícolas ou época da desova dos peixes, escolhiam uma delas como ponto de referência. Para esse fim escolhiam o milho, por exemplo ou então o caju. Na época do amadurecimento do milho ou no tempo do caju, realizavam o ataque.
.
Segundo informação cedida pelo indianista João Américo Peret: "Eles marcam reuniões sem o Calendário Gregoriano, e chegam no prazo combinado".
.
Os Karajá contam:
Maybã (é tempo de milho verde), corresponde a Janeiro;
Baebara (o rio parou de encher) mês de Fevereiro;
Tubyraçó (começou a vazante) mês de Março;
We-ra (já tem praia de fora) Abril;
Rarado--uebto (as árvores têm flores que alimentam os animais) Maio;
Rarado-sí (as árvores têm frutos) Junho;
Kotu-sí (o tracajá põe ovos) Julho;
Bederá (começaram as queimadas para fazer roçado) Agosto;
Kotuni-sí (as tartaruga já põem ovos) Setembro;
Baé-bã dereká (iniciaram as chuvas e o rio começa a encher) Outubro;
Kotuni-reioré (as tartarugas estão nascendo) Novembro;
Baorá (o rio está enchendo) Dezembro.
.
Outros índios contam o tempo: pelo verão, inverno, outono e primavera; nos quartos da lua; quando começa a florir o Ipê (pau d´arco), o pequizeiro; quando certos frutos amadurecem; no repiquete (cabeça d´água em que o rio enche e vasa em seguida); na enchente e na vazante; em quantos dormir (noites), quando o sol estiver nesta posição.”
.
Algumas tribos, como a dos guaranis, conheciam duas estações: do Sol (coaraci-ara) e das chuvas (almana-ara). Os caingangues, no Sul do Brasil, contavam até dez dias passados ou futuros, usando os dez dedos das mãos. "Ningké" significa "mão" e "ten" quer dizer "com". Reunidos esses ordinais com a palavra Sol, obtinham os dias da semana, e com a palavra Lua, as semanas.
.
Dias caingangues
1 - pir
2 - lenglé
3 - tektong
4 - vaitkanklá
5 - petigare
6 - ningkéntenyrn
7 - ningkéntenyrnlenglé
8 - ningkéntengrutektong
9 - ningkéntyrukenkta
10 - ningkévaitklitp
.
Segundo o blog Monomito, as constelações dos tupis-guaranis diferem das concepções das sociedades exteriores ocidentais principalmente em três aspectos:
Primeiro, as principais constelações ocidentais registradas pelos povos antigos são aquelas que interceptam o caminho imaginário que chamamos de eclíptica, por onde aparentemente passa o Sol, e próximo do qual encontramos a Lua e os planetas. Essas constelações são chamadas zodiacais. As principais constelações indígenas estão localizadas na Via Láctea (Tapi’i Rape), a faixa esbranquiçada que atravessa o céu, onde as estrelas e as nebulosas aparecem em maior quantidade, facilmente visível à noite. A Via Láctea é conhecida como Caminho da Anta ou como a Morada dos Deuses pela maioria das etnias dos tupis-guaranis.
Os desenhos das constelações ocidentais são feitos pela união de estrelas. Mas, para os tupis-guaranis, as constelações são constituídas pela união de estrelas e, também, pelas manchas claras e escuras da Via Láctea, sendo mais fáceis de imaginar. Muitas vezes, apenas as manchas claras ou escuras, sem estrelas, formam uma constelação. Os guaranis chamam a Grande Nuvem de Magalhães de Bebedouro da Anta (Tapi’i Huguá) e a Pequena Nuvem de Magalhães de Bebedouro do Porco-do-Mato (Coxi Huguá).
O terceiro aspecto que diferencia as constelações Tupis-Guaranis das ocidentais está relacionado ao número delas conhecido pelos indígenas. A União Astronômica Internacional (UAI) utiliza um total de 88 constelações, distribuídas nos dois hemisférios terrestres, enquanto certos grupos indígenas já nos mostraram mais de 100 constelações, vistas de sua região de observação. Quando indagados sobre quantas constelações existem, os pajés dizem que tudo que existe no céu existe também na Terra, que nada mais seria do que uma cópia imperfeita do céu. Assim, cada animal terrestre tem seu correspondente celeste, em forma de constelação.
O físico e astrônomo Carlos Alfredo Argüello conta da sua preocupação em mapear o céu dos índios, e em criar situações onde os mais jovens se interessem pelo saber dos anciões, que está se perdendo:
.
"Quando introduzimos um conhecimento novo, muitas vezes estamos matando uma parte da cultura que vigia antes. É uma espécie de massacre cultural dos índios", argumenta. Certa vez, exemplifica, levou um índio tapirapé ao Planetário de Campinas. Lá, queria que seu amigo o fizesse ver a constelação da Onça, que existe na cultura tapirapé e, ao mesmo tempo, pretendia mostrar-lhe a constelação do Escorpião. Como nenhum dos dois foi capaz de ter a visão do outro, Argüello lançou mão de um recurso do planetário, onde a constelação aparecia desenhada, com linhas ligando as estrelas. Dessa vez, então, o índio viu a do Escorpião. Tempos depois, pediu novamente ao índio que lhe mostrasse a constelação da Onça, ao que o índio respondeu: "Desde aquela vez, nunca mais consegui ver a Onça". "Este foi o dia em que o escorpião matou a onça", conta, com tristeza, Argüello.
.
O físico e arqueo-astrônomo Germano Bruno Affonso, professor aposentado da Universidade Federal do Paraná, é um dos mais premiados cientistas nacionais, e nos relata mais sobre a cosmografia indígena no Brasil:
A principal unidade de tempo dos Tupinambás eram as lunações. Por meio de lunações conseguiam uma unidade de tempo correspondente ao nosso mês. Thevet nos informa que as perguntas sobre a idade, os acontecimentos tribais, tudo era respondido por seu intermédio: - “há tantas luas eu nasci....”
.
A eficiência do sistema total de demarcação do tempo Tupinambá, pode ser apreciada em relação com o nosso. Abbeville, que fez tal comparações, chegou a conclusões interessantes:
.
1) O movimento do Sol de um trópico ao outro e vice-versa, dava-lhes uma noção de tempo correspondente ao ano europeu.
.
2) A delimitação das épocas de chuvas e de ventos ou do tempo dos cajus, dava-lhes uma noção de tempo correspondente ao mês europeu.
.
3) Os movimentos da estrela "seichu", que aparecia antes das chuvas para desaparecer em seguida, davam-lhes um conhecimento empírico do interstício, ou seja, do tempo decorrido de um ano a outro.
.
4) Pela correlação entre as fases da lua e dos movimentos das águas, obtinham uma nova noção de tempo.
Para exemplificar toda esta teoria, escolhemos um sacrifício ritual, onde pode-se visualizar mais facilmente a regularidade destes fenômenos naturais.
.
O prisioneiro deveria ser conservado com vida por algum tempo. Neste caso, precisavam determinar a data da execução em quatro ou cinco luas, "verbi-gratia". Colocavam então, em seu pescoço um colar constituído com um número correspondente de certos frutos redondos. Outras vezes, o número de luas era computado por intermédio de pequenos colares, também colocados no pescoço do prisioneiro. Cada lua que passava tiravam uma conta do colar ou um pequeno colar do pescoço. Quando chegavam a última unidade, o prisioneiro deveria ser executado e todos os preparativos fundamentais para as festas e cerimônias se achavam prontos.
.
A guerra contra seus inimigos também eram marcadas com antecedência regular. Neste caso, podiam referir-se a certo número de luas. Mas se utilizavam também de outro processo. Como era conhecida a época da colheita de certos produtos agrícolas ou época da desova dos peixes, escolhiam uma delas como ponto de referência. Para esse fim escolhiam o milho, por exemplo ou então o caju. Na época do amadurecimento do milho ou no tempo do caju, realizavam o ataque.
.
Segundo informação cedida pelo indianista João Américo Peret: "Eles marcam reuniões sem o Calendário Gregoriano, e chegam no prazo combinado".
.
Os Karajá contam:
Maybã (é tempo de milho verde), corresponde a Janeiro;
Baebara (o rio parou de encher) mês de Fevereiro;
Tubyraçó (começou a vazante) mês de Março;
We-ra (já tem praia de fora) Abril;
Rarado--uebto (as árvores têm flores que alimentam os animais) Maio;
Rarado-sí (as árvores têm frutos) Junho;
Kotu-sí (o tracajá põe ovos) Julho;
Bederá (começaram as queimadas para fazer roçado) Agosto;
Kotuni-sí (as tartaruga já põem ovos) Setembro;
Baé-bã dereká (iniciaram as chuvas e o rio começa a encher) Outubro;
Kotuni-reioré (as tartarugas estão nascendo) Novembro;
Baorá (o rio está enchendo) Dezembro.
.
Outros índios contam o tempo: pelo verão, inverno, outono e primavera; nos quartos da lua; quando começa a florir o Ipê (pau d´arco), o pequizeiro; quando certos frutos amadurecem; no repiquete (cabeça d´água em que o rio enche e vasa em seguida); na enchente e na vazante; em quantos dormir (noites), quando o sol estiver nesta posição.”
.
Algumas tribos, como a dos guaranis, conheciam duas estações: do Sol (coaraci-ara) e das chuvas (almana-ara). Os caingangues, no Sul do Brasil, contavam até dez dias passados ou futuros, usando os dez dedos das mãos. "Ningké" significa "mão" e "ten" quer dizer "com". Reunidos esses ordinais com a palavra Sol, obtinham os dias da semana, e com a palavra Lua, as semanas.
.
Dias caingangues
1 - pir
2 - lenglé
3 - tektong
4 - vaitkanklá
5 - petigare
6 - ningkéntenyrn
7 - ningkéntenyrnlenglé
8 - ningkéntengrutektong
9 - ningkéntyrukenkta
10 - ningkévaitklitp
.
Segundo o blog Monomito, as constelações dos tupis-guaranis diferem das concepções das sociedades exteriores ocidentais principalmente em três aspectos:
Primeiro, as principais constelações ocidentais registradas pelos povos antigos são aquelas que interceptam o caminho imaginário que chamamos de eclíptica, por onde aparentemente passa o Sol, e próximo do qual encontramos a Lua e os planetas. Essas constelações são chamadas zodiacais. As principais constelações indígenas estão localizadas na Via Láctea (Tapi’i Rape), a faixa esbranquiçada que atravessa o céu, onde as estrelas e as nebulosas aparecem em maior quantidade, facilmente visível à noite. A Via Láctea é conhecida como Caminho da Anta ou como a Morada dos Deuses pela maioria das etnias dos tupis-guaranis.
Os desenhos das constelações ocidentais são feitos pela união de estrelas. Mas, para os tupis-guaranis, as constelações são constituídas pela união de estrelas e, também, pelas manchas claras e escuras da Via Láctea, sendo mais fáceis de imaginar. Muitas vezes, apenas as manchas claras ou escuras, sem estrelas, formam uma constelação. Os guaranis chamam a Grande Nuvem de Magalhães de Bebedouro da Anta (Tapi’i Huguá) e a Pequena Nuvem de Magalhães de Bebedouro do Porco-do-Mato (Coxi Huguá).
O terceiro aspecto que diferencia as constelações Tupis-Guaranis das ocidentais está relacionado ao número delas conhecido pelos indígenas. A União Astronômica Internacional (UAI) utiliza um total de 88 constelações, distribuídas nos dois hemisférios terrestres, enquanto certos grupos indígenas já nos mostraram mais de 100 constelações, vistas de sua região de observação. Quando indagados sobre quantas constelações existem, os pajés dizem que tudo que existe no céu existe também na Terra, que nada mais seria do que uma cópia imperfeita do céu. Assim, cada animal terrestre tem seu correspondente celeste, em forma de constelação.
O físico e astrônomo Carlos Alfredo Argüello conta da sua preocupação em mapear o céu dos índios, e em criar situações onde os mais jovens se interessem pelo saber dos anciões, que está se perdendo:
.
"Quando introduzimos um conhecimento novo, muitas vezes estamos matando uma parte da cultura que vigia antes. É uma espécie de massacre cultural dos índios", argumenta. Certa vez, exemplifica, levou um índio tapirapé ao Planetário de Campinas. Lá, queria que seu amigo o fizesse ver a constelação da Onça, que existe na cultura tapirapé e, ao mesmo tempo, pretendia mostrar-lhe a constelação do Escorpião. Como nenhum dos dois foi capaz de ter a visão do outro, Argüello lançou mão de um recurso do planetário, onde a constelação aparecia desenhada, com linhas ligando as estrelas. Dessa vez, então, o índio viu a do Escorpião. Tempos depois, pediu novamente ao índio que lhe mostrasse a constelação da Onça, ao que o índio respondeu: "Desde aquela vez, nunca mais consegui ver a Onça". "Este foi o dia em que o escorpião matou a onça", conta, com tristeza, Argüello.
.
O físico e arqueo-astrônomo Germano Bruno Affonso, professor aposentado da Universidade Federal do Paraná, é um dos mais premiados cientistas nacionais, e nos relata mais sobre a cosmografia indígena no Brasil:
Os Guarani têm uma rosa-dos-ventos. Uma informação que li sobre a gênese guarani era de que no céu existiam palmeiras azuis representando os quatro deuses (os quatro pontos cardeais: norte, sul, leste, oeste) e suas quatro esposas (os pontos colaterais: nordeste, noroeste, sudeste, sudoeste) formando uma rosa-dos-ventos. Os Guarani dizem que tudo o que existe no Céu existe também na Terra. Porque a Terra nada mais é do que um reflexo do Céu. Aí começamos a procurar algum vestígio concreto disso. Até que um dia no Paraná, em Itapejara D’Oeste, na beira do rio Chopim, encontramos essa rosa-dos-ventos! Encontramos um círculo de palmeiras. Colocamos o teodolito no meio do círculo e medimos as direções dessas palmeiras. O resultado é que deu exatamente os pontos cardeais e os pontos colaterais. Uma rosa dos ventos de palmeiras aqui na Terra! Curioso notar que a palavra Itapejara não significa nada em guarani. No entanto, originalmente essa região se chamava Tapejara, que significa o Caminho do Senhor. E certamente uma rosa-dos-ventos é um excelente guia.
Baixe em pdf o texto "As Constelações Indígenas Brasileiras", de Germano Bruno Affonso, e leia também "Astronomia Afro-Indígena". Também é interessante e pertinente conhecer "O uso do fogo: o manejo indígena e a piromania da monocultura", de Mauro Leonel. Lançado por Germano Afonso, o cd-rom "Arqueoastronomia brasileira" apresenta histórias sobre dez constelações indígenas, sobre a Lua, o Sol e Vênus (que adquirem inúmeros significados na cultura indígena), e o resgate de mitos, entre outros. O cd-rom pode ser adquirido por R$ 25 junto ao professor Germano Afonso pelo mail afonso@fisica.ufpr.br
Fonte: Cara do Brasil . Bibliografia consultada: "Organização Social dos Tupinambás" , de Florestan Fernandes (1949).
Fonte: Cara do Brasil . Bibliografia consultada: "Organização Social dos Tupinambás" , de Florestan Fernandes (1949).
Nenhum comentário:
Postar um comentário