As causas de Saramago
José Saramago criou a 29 de junho último em Portugal uma fundação com o seu nome que irá preservar e estudar a sua obra literária e espólio e ainda tomar partido "por grandes e pequenas causas". Na declaração de princípios escrita para a Fundação José Saramago, o escritor português, prêmio Nobel de Literatura em 1998, determina que a fundação deve assumir nas suas atividades, como norma de conduta, "tanto na letra como no espírito", a Declaração Universal dos Direitos Humanos (assinada em Nova Iorque em 1948) e que mereçam particular atenção os problemas do meio ambiente e do aquecimento global do planeta, "os quais atingiram níveis de tal gravidade que já ameaçam escapar às intervenções correctivas que começam a esboçar-se no mundo". "Bem sei que, por si só, a Fundação José Saramago não poderá resolver nenhum destes problemas, mas deverá trabalhar como se para isso tivesse nascido. Como se vê, não peço muito, peço-vos tudo", apela o Nobel português.
A notícia vem de encontro às recentes declarações de José Saramago em defesa dos índios na Colômbia, onde colocou em cheque a existência de uma identidade ibero-americana:
O Nobel da Literatura José Saramago pôs ontem em dúvida a existência de uma identidade ibero-americana e protestou pelo esquecimento a que são votados os índios, durante uma conferência de imprensa em Cartagena das Índias.
“Não sei o que é a identidade ibero-americana, ou melhor, ninguém o sabe”, disse o escritor português na conferência inaugural do I Encontro Internacional de dirigentes e bolseiros ibero-americanos, convocado pela Fundação Carolina de Espanha.
Para que haja identidade, tem de haver igualdade entre os componentes de uma comunidade e não é isso que se vê entre Espanha, Portugal e os países americanos, assinalou o escritor português. “Na suposição de que exista uma identidade ibero-americana, teríamos que chegar à conclusão de que, pelo menos desde 1492, existe uma igualdade entre o que se passa na Península Ibérica e o que se passa neste continente”, disse.
Saramago lembrou que a Ibero-América é um conceito aplicado a milhões de pessoas que não têm nada que ver entre si e citou o caso dos índios, que eram os donos da terra quando os europeus chegaram ao Novo Mundo e hoje estão marginalizados política, social e economicamente.
“Se dizemos que somos ibero-americanos, há que explicar em que consiste isso”, sublinhou o escritor português, afirmando que na comunidade ibero-americana “está a faltar o índio”.
Quando se fala da identidade e integração ibero-americana isso é feito na ótica dos que escreveram a história da América, acrescentou Saramago, notando que a idéia que existe da Conquista seria outra se os cronistas da mesma tivessem sido os índios. Mais entusiasta com a identidade ibero-americana esteve o ex-presidente colombiano Belisario Betancur, que destacou a importância de, no começo do século XXI, haver uma vintena de países dos dois lados do Atlântico que partilham muitos desafios e esperanças. Um desses desafios consiste em reduzir os níveis da pobreza na região, investindo na educação, defenderam os participantes.
Não foi nenhuma novidade: antes Saramago já demonstrara essa mesma consciência política sobre os povos ameríndios ao se pronunciar sobre a luta zapatista no México (leia aqui):
Porque los indios de Chiapas no son los únicos humillados y vencidos del mundo: en los cinco continentes se repiten cada día situaciones de vejación y crimen contra grupos, etnias, pueblos, en definitiva, contra los pobres de los pobres, contra lo que el sistema imperante, el capitalismo autoritario que rige el mundo, considera inútil para sus objetivos y por lo tanto, descartable, saldo, material de derribo susceptible de eliminación sin pagar por ello. Sin que los auténticos responsables paguen por ello, como una y otra vez estamos viendo. Sin embargo, en Chiapas se ha dicho basta. Los indios se han organizado para combatir y negociar. En torno del subcomandante Marcos, han plantado cara al gobierno y han dado una lección de dignidad al mundo y esto no es retórica. La decisión firme de vivir otra vida la percibimos en los hombres y mujeres con las que hablamos, en la firmeza y en la rotundidad de gestos y palabras, en la nueva concepción que de ellos mismos tienen. Los indios han asumido para ellos el proyecto de Zapata, y zapatistas ellos, es decir, bajo la bandera de ``Tierra y libertad'' que Zapata esgrimió, seguirán combatiendo al gobierno, al latifundio, al capital, a la concepción de la historia que los considera superfluos, especie a extinguir.
Fonte: Blog "As Beiras". Visite também o site de José Saramago: de sua belíssima obra lembraremos ainda aqui este poema -
Para que haja identidade, tem de haver igualdade entre os componentes de uma comunidade e não é isso que se vê entre Espanha, Portugal e os países americanos, assinalou o escritor português. “Na suposição de que exista uma identidade ibero-americana, teríamos que chegar à conclusão de que, pelo menos desde 1492, existe uma igualdade entre o que se passa na Península Ibérica e o que se passa neste continente”, disse.
Saramago lembrou que a Ibero-América é um conceito aplicado a milhões de pessoas que não têm nada que ver entre si e citou o caso dos índios, que eram os donos da terra quando os europeus chegaram ao Novo Mundo e hoje estão marginalizados política, social e economicamente.
“Se dizemos que somos ibero-americanos, há que explicar em que consiste isso”, sublinhou o escritor português, afirmando que na comunidade ibero-americana “está a faltar o índio”.
Quando se fala da identidade e integração ibero-americana isso é feito na ótica dos que escreveram a história da América, acrescentou Saramago, notando que a idéia que existe da Conquista seria outra se os cronistas da mesma tivessem sido os índios. Mais entusiasta com a identidade ibero-americana esteve o ex-presidente colombiano Belisario Betancur, que destacou a importância de, no começo do século XXI, haver uma vintena de países dos dois lados do Atlântico que partilham muitos desafios e esperanças. Um desses desafios consiste em reduzir os níveis da pobreza na região, investindo na educação, defenderam os participantes.
Não foi nenhuma novidade: antes Saramago já demonstrara essa mesma consciência política sobre os povos ameríndios ao se pronunciar sobre a luta zapatista no México (leia aqui):
Porque los indios de Chiapas no son los únicos humillados y vencidos del mundo: en los cinco continentes se repiten cada día situaciones de vejación y crimen contra grupos, etnias, pueblos, en definitiva, contra los pobres de los pobres, contra lo que el sistema imperante, el capitalismo autoritario que rige el mundo, considera inútil para sus objetivos y por lo tanto, descartable, saldo, material de derribo susceptible de eliminación sin pagar por ello. Sin que los auténticos responsables paguen por ello, como una y otra vez estamos viendo. Sin embargo, en Chiapas se ha dicho basta. Los indios se han organizado para combatir y negociar. En torno del subcomandante Marcos, han plantado cara al gobierno y han dado una lección de dignidad al mundo y esto no es retórica. La decisión firme de vivir otra vida la percibimos en los hombres y mujeres con las que hablamos, en la firmeza y en la rotundidad de gestos y palabras, en la nueva concepción que de ellos mismos tienen. Los indios han asumido para ellos el proyecto de Zapata, y zapatistas ellos, es decir, bajo la bandera de ``Tierra y libertad'' que Zapata esgrimió, seguirán combatiendo al gobierno, al latifundio, al capital, a la concepción de la historia que los considera superfluos, especie a extinguir.
Fonte: Blog "As Beiras". Visite também o site de José Saramago: de sua belíssima obra lembraremos ainda aqui este poema -
"Demissão"
Este mundo não presta, venha outro.
Já por tempo de mais aqui andamos
A fingir de razões suficientes.
Sejamos cães do cão:sabemos tudo
De morder os mais fracos, se mandamos,
E de lamber as mãos se dependentes.
Este mundo não presta, venha outro.
Já por tempo de mais aqui andamos
A fingir de razões suficientes.
Sejamos cães do cão:sabemos tudo
De morder os mais fracos, se mandamos,
E de lamber as mãos se dependentes.
(José Saramago)
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