11 de setembro de 2007

Vozes Indígenas no Brasil

Pintura de Deuseni Félix - "Etnia Kayapó"

A Rádio Nederland, emissora internacional da Holanda, enviou às aldeias ameríndias brasileiras os jornalistas Mário de Freitas e Railda Herrero para gravarem uma série de programas dentro de um projeto intitulado "Vozes Indígenas no Brasil". Os primeiros resultados dessas gravações estão em dez programas, lançados em CD e também disponíveis para download. Foram concedidas, com muita atenção, pelos representantes dos 235 povos originários, que sobrevivem no Brasil, e feitas graças ao carinho e dedicação de dezenas de trabalhadores solidários com esta causa. Os programas são desenvolvidos por temas. Muitas histórias não couberam no formato definido por programadores de rádio e esperam por novos resgates. Esta série é apenas um começo. Mas é também um complemento a uma tarefa que vem sendo cumprida por muitos, e, felizmente, agora pelos próprios indígenas. Este programa recebeu o Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos em 2005.


Programa 1 - Diversidade étnica


O Brasil é um mosaico com 235 povos indígenas diferenciados. O microfone da Rádio Nederland não se abriu para todos, pela dificuldade geográfica e de tempo. Mas foi a diferentes rincões para dar uma amostra da diversidade étnica de nosso país. Nestas aldeias, comunidades, assembléias etc. os entrevistados de diferentes etnias falaram sobre seus povos, seus mundos, seus problemas, comparando presente e passado. Expressaram-se em suas línguas e em português, derrubando estereótipos e provando que não há um índio genérico. São povos diferenciados que, apesar da discriminação histórica, têm orgulho de ser e resistir e estão com os olhos puxados na direção de um país que precisa enxergar a importância da diferença. Ouça o programa

Programa 2 - Línguas indígenas

Troncos Tupi, Macro-Jê. Famílias Tupi-Guarani, Jê, Aruak, Tukano. Línguas gerais, línguas ameaçadas, línguas isoladas. Dúvidas, confusões lingüísticas, influência no modo de falar brasileiro. Para falar de tronco que não seja de árvore, de família, que não seja a própria, o microfone foi ao Laboratório de Línguas da UNB, e se abriu ao maior especialista em línguas indígenas no Brasil: o professor Aryon Dall´Igna Rodrigues. Auxiliado por dezenas de falantes, o pesquisador da Universidade de Brasília decifrou grupos e subgrupos, falou sobre classificações e ainda sobre a fascinante aventura de viajar no conhecimento das línguas indígenas de nosso território.

O mais antigo especialista no assunto não se esqueceu de falar até da importância do príncipe holandês, responsável pelos primeiros registros escritos sobre línguas antigas do Nordeste. O toponimista Benedito Prézia auxiliou na ida à raiz de alguns problemas, para acabar com o falso mito de que há apenas uma língua indígena em nosso país. Representantes de comunidades, desde a Amazônia até o Nordeste, mostraram as diferenças nas falas e o trabalho do resgate da própria língua, às vezes adormecida nas mentes dos mais idosos, pelo medo do silêncio imposto pelos dominadores de plantão. Ouça o programa

Programa 3 - Terra

Quantas terras indígenas há no Brasil? Quantas estão demarcadas? Quem disse que os povos indígenas têm muita terra? Comparando terras indígenas e grandes fazendas, este programa fala de um problema histórico largo e fundo: latifúndio. O Brasil é um triste líder mundial na concentração de terras nas mãos de latifundiários e a extensão utilizada para agricultura é mínima. No entanto, elevam-se discursos para impedir a garantia do território dos povos originais.

Neste programa, lideranças de diferentes regiões falam da cobiça e da violência para roubar a terra, um bem fundamental para a garantia da sobrevivência física e da cultura desses povos diferenciados. Os números históricos comprovam e reprovam a política oficial de terras no Brasil. Os depoimentos sobre essa espoliação complementam o quadro manchado pelo sangue das vítimas dessa guerra. Ouça o programa

Programa 4 - Plantando desertos verdes

Pau Brasil, jatobá, catolé, palmeira, pequi, palmito, caju, ingá, carnaúba e tantas outras espécies que garantem a diversidade das matas brasileiras vão ao chão enquanto se ouve este programa. Depoimentos de atingidos pela indústria da monocultura mostram essa derrubada para dar lugar ao capim, à soja e ao eucalipto que alimenta fornalhas de multinacionais da celulose.

A desertificação verde, ou derrubada de matas nativas para plantio de monoculturas, que destroem as culturas, é retratada por indígenas que sofrem os efeitos dessas plantações extensivas. Cooperantes e analistas confirmam o quadro da devastação ambiental, em detrimento do lucro da indústria e do agronegócio. Ouça o programa
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Programa 5 - Direitos

Constituição, Estatuto do Índio, Direitos indígenas, Autonomia, Direitos violados, violência, impunidade. Advogados indigenistas e indígenas discorrem sobre o quadro jurídico em que se inserem os povos indígenas nos dias atuais. Apesar da discriminação, do preconceito e da falta de justiça, vozes das aldeias recitam de cor os números das leis violadas no país.

Cada vez mais conscientes de seus direitos, falam sobre a busca por mais informação e formação. E falam porque não desistem nem mesmo diante de injustiças e impunidades, como os casos dos assassinatos de Galdino Pataxó, Marçal Tupã´I e tantos outros. Ouça o programa
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Programa 6 - Injustiça na terra do sol

A terra Indígena Raposa Serra do Sol, no nordeste de Roraima, tornou-se um caso emblemático de injustiça contra povos indígenas. Esperando mais de sete anos por um decreto, para homologar a demarcação, os Makuxi, Wapixana, Taurepang, Patamona e Ingaricó, que vivem nas mais de 150 comunidades nessa região da serra criada pelo ancestral Makunaíma, contam a batalha para reverter a moeda de troca política que se tornou a área deles.

Roraima é o último portal da soja, que devastou áreas indígenas do Mato Grosso do Sul, subindo a oeste, em todos os estados constantes no mapa brasileiro. A terra criada por Makunaíma, filho do sol e avô dos Makuxi é um exemplo de como a cobiça pode tentar impedir sonhos. Mas, nem mesmo os atentados, os incêndios e as ameaças param os descendentes de Makunaíma.

Na Aldeia Maturuca, a Brasília da região, eles contam as batalhas vencidas contra a cachaça trazida pelo branco. E falam da esperança de que a justiça indígena vença. As decisões que mudaram a vida na área, a organização para combater desmandos e outras histórias são contadas por estes povos no embalo dos forrós, compostos pelos artistas locais, para animar a campanha pela regularização da terra. Ouça o programa

Programa 7 - Educação e saúde

O direito à educação diferenciada está na Constituição. No entanto, na prática, a história é outra. E, quando o assunto é saúde, a situação não é diferente. O quadro negro está cheio de faltas na educação. Quem fala sobre o tema são educadores indígenas que, apesar de todas as dificuldades, não desistem.

Batalham para colocar em prática programas diferenciados e recebem prêmios por esta dedicação, como na Aldeia de Caarapó, no Mato Grosso do Sul. Experiências novas estão se somando para escrever uma nova página sobre educação indígena, onde a evasão escolar vem sendo trocada pelo aprender com prazer, quando há respeito à cultura e à tradição.

A saúde está intimamente ligada ao berço da cultura, a terra, chão gerador de frutos. Com esta visão, diversos agentes de saúde indígenas se queixam dos problemas locais e ouvem explicações para a falta de sucesso no tratamento a esta questão por instâncias governamentais em diferentes gestões administrativas. Ouça o programa
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Programa 8 - Violência

Os rastros da violência histórica estão presentes em diferentes comunidades indígenas. De uma população original estimada em cerca de cinco milhões sobrevivem aproximadamente 730 mil em nosso território. Desnutrição, fome, alcoolismo, assassinato de lideranças, roubo de terras e suicídios são assuntos de representantes de diversas comunidades de norte a sul do Brasil neste programa. Do Nordeste, os Pankararu e Xukuru falam sobre violências históricas e recentes. E os Pataxó falam sobre o tema, presente desde a chegada de Cabral.

No Mato Grosso do Sul o microfone da reportagem registrou o lamento pela morte de crianças por desnutrição aguda. Nesse estado, os Guarani e estudiosos tentam explicar fenômenos enigmáticos: o suicídio e o sentimento de "ser um suicidado", por causa da falta de condições de viver de acordo com a própria cultura. Quando o assunto é um enigma relacionado ao suicídio, o caso dos Zuruahã é analisado por especialista. Pessoas dessa etnia decidem quando é a hora de ir para a casa do trovão pelas próprias mãos. Ou, traduzindo para o português, quando vão se suicidar. Ouça o programa
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Programa 9 - Organização Indígena

Para resistir a tantas ameaças, uma ferramenta tem sido fundamental para centenas de povos indígenas que sobreviveram ao massacre histórico: a organização. Em todos os grotões do Brasil há organizações indígenas. São identificadas por siglas pouco conhecidas, mas são centenas e fazem a diferença para lideranças, professores, artesãos, mulheres e agentes de saúde que delas participam.

Há ainda organizações regionais, em alguns estados, e entidades fortes como a Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) e a Apoinme (Associação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Leste).

Lideranças dessas organizações falam sobre união, projeto etnopolítico, partido indígena, entre outros temas que esquentam debates em diversas áreas. As vozes das mulheres organizadas estão garantidas nesse microfone aberto, que registra ainda experiências exemplares de cooperativas, como a dos produtores de guaraná, dos Sateré-Maué. Ouça o programa

Programa 10 - Diálogo intercultural

Para falar de diálogo é necessário falar com o outro, o não-indígena, que, tradicionalmente, nunca escutou as vozes dos 235 povos. Este programa se inicia comemorando as mudanças de atitudes preconceituosas resultantes da falta de diálogo, de acordo com as palavras de um arte-educador Guarani. E entra pelo caminho do diálogo inter-religioso com uma análise do teólogo e pensador Leonardo Boff, seguido do bispo fiel à Teologia da Libertação missionária, Dom Pedro Casaldáliga, do Araguaia.

O diálogo internacional é registrado pelo microfone aberto em diferentes pontos do Brasil, onde vivem holandeses que trabalham junto a povos indígenas. E o diálogo musical é cantado por Marlui Miranda, cujo trabalho é ouvido durante os dez programas desta série. Levando os sons das aldeias para os palcos e CDs, Marlui é a ponte na garantia de um acervo musical vivo dos mais ricos do país e fala sobre a alegria dessa travessia.

Ponte intercultural também é o trabalho de artistas como Deuseni Félix, que registra com urucum misturado às tintas tradicionais as imagens das aldeias que transporta para suas telas. Com diferentes linguagens e tons, o diálogo com povos indígenas é o que traz a voz desses entrevistados neste programa. Ouça o programa

Fonte: Radio Nederland

Pintura de Deuseni Félix - "Jovem Suiá"

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