29 de julho de 2007

Ceferino Namunkurá e a identidade mapuche

Ceferino Namunkurá representado já como Beato
(arco e flexa abandonados ao chão)


Na Argentina, o provincial dos salesianos para a região Patagônia Norte, Padre Vicente Tirabasso, afirmou que a próxima beatificação do índio mapuche Ceferino Namunkurá, anunciada para o dia 11 de novembro, "permite descobrir que um patagônico especial soube viver sua fidelidade ao Evangelho, por isso queremos propô-lo aos jovens como modelo de projeto de vida". O sacerdote afirmou que a causa de beatificação de Ceferino se abriu porque teve "uma fé profunda, radical. Porque amou Cristo desde seu povo, com todas as conotações de viver a vida cristã em plenitude. Também por sua atitude de serviço, porque decidiu ser sacerdote para ser missionário entre seu povo e por sua profunda expressão de sacrifício demonstrada frente a seus padecimentos de sua saúde".

No artigo "El Alma del Indio", Celia Langdeau Cussen narra que: "Em 1972 o Papa Paulo VI declarou a Ceferino "venerável" - o primeiro passo para a canonização - , e agora dezenas de milhares de pessoas acorrem a celebrar o aniversário deste santo homem no Parque Ceferino Namuncurá, localizado entre pomares de maçãs e peras junto a um braço do Rio Negro, 170 quilômetros a leste de Neuquén, e a dez horas de caminho de Temuco. (...) Aí se encontra uma imagem de tamanho natural de Ceferino, e é onde se venera a ele durante o ano, até o momento em que, para a celebração de seu nascimento, a colocam afora de modo que os fiéis possam tocá-la e formular suas petições de melhor saúde ou, nestes duros tempos pelos quais passa Argentina, de um trabalho estável. A estátua de madeira de cor amarela mostra a um adolescente em uniforme escolar, o cabelo bem penteado repartido do lado esquerdo, levando entre as mãos um livro que apóia contra seu peito. No dia da celebração alguém pôs sobre os ombros da imagem um delicado poncho branco que o vento agita. Não fica claro se o poncho protege a Ceferino das baixas temperaturas nesta manhã cristalina, ou se seu propósito é suavizar a vestimenta de madeira para que assim recobre mais vida. Talvez alguém pôs ali o poncho para recordar ao mundo que este estudante em uniforme de colégio salesiano era além disso um mapuche."


Ann Ball explica que: Ceferino Namunkurá estava destinado por nascimento a ser um “cacique” ou líder de seu povo, os índios Araucanos dos pampas argentinos. Oitavo dos doze filhos do chefe Manuel Namunkurá, Ceferino fôra escolhido - em virtude de sua inteligência e habilidade- ta ser o sucessor de seu pai como líder desta tribo aguerrida (a sucessão era hereditária, mas não recaía necessáriamente no filho mais velho). Entretanto Ceferino levou sua curta vida treinando para um diferente tipo de liderança. Sua ambição era conduzir seu povo à religião de um Deus único. Faleceu em Roma de tuberculose, em 1905, quando ainda não tinha cumprido os 19 anos.

O milagre atribuído ao mapuche e pelo qual será beatificado aconteceu em 2000, quando uma mulher de 24 anos da província de Córdoba, no centro do país, pediu intensamente sua intercessão ante Deus para salvá-la de um câncer de útero e se curou. A Coordenação de Organizações Mapuches recusou a beatificação afirmando que não aceitam este "perverso título para um irmão nosso que morreu nas mãos da colonização. Desterrado de sua terra de origem, consumiu-o a tuberculose". O comunicado da COM diz que a beatificação de Namuncurá é um presente que não pediram. Eles consideram o papa Bento XVI “um manipulador que disse faz pouco que a religião católica não tinha sido imposta” aos aborígenes. Para a COM, a decisão do Vaticano resulta em "uma distração para um povo que já não se distrai".

O jornal Mercúrio, do Chile, publicou nota afirmando que no bispado de Araucanía, jurisdição eclesiástica que compreende a maior parte do território mapuche no território chileno, o beato indígena "não conta sequer com uma oração, uma estampa ou uma bibliografia de sua vida". Segundo o vigário do bispado de Araucanía, Gerardo Franck, os mapuches sequer sabem que Namuncurá era um dos seus. Já o jornalista Rodolfo Chavez, da agência Rio Negro On Line, afirma que os mapuches da família de Namunkurá, residentes em San Ignacio, ao sul da província de Neuquén, estão "muito contentes porque o declararam santo”. Eles trabalham na construção de um santuário de madeira, onde esperam dar o descanso final ao santo mapuche, e aguardam muitas visitas de peregrinos crentes.

O jornal argentino La Nueva Provincia relatou que após considerar que a Igreja católica o levou a Europa "vivo e o devolveu morto e sem identidade", a COM, em um comunicado assinado por seu porta-voz, Jorge Nahuel, rechaçou a beatificação de Ceferino Namunkurá - "Não lhes aceitamos este perverso título para um irmão nosso que morreu em mãos da colonização. Desterrado de sua terra de origem, consumiu-o a tuberculose", apontou Nahuel. O documento questiona o método usado pelo exército argentino durante a chamada Conquista do Deserto, no século 19, e agrega que os mapuches não tinham defesa contras as doenças que, como a tuberculose, os soldados eram portadores.


Leia na íntegra o impactante comunicado mapuche desta semana:

Estamos alertas cuando el poder hace regalos que ni siquiera pedimos y que consideran importantes para tener distraídos a sus oprimidos. Por ejemplo, Videla les regaló un mundial de fútbol a los argentinos y todos contentos, inclusive saltando delante del propio dictador como festejándolo. Les regaló una "mano dura" y los que pedían semejante regalo se distrajeron, mientras veíamos espantados y horrorizados que se quedaban con nuestros hijos y nietos en nombre de una política de Estado. El mismo terrorismo de Estado que cayó 120 años atrás sobre la vida mapuche y que generó desapariciones, torturas y apremios ilegales durante la campaña de exterminio de Roca, acompañado por una Iglesia que reclutaba nuestros "picikecé" (niños) y los "amaestraba" en internados y albergues, hasta anular la identidad, el "rakizuam"/pensamiento, el "kimvn"/conocimiento ancestral. Es decir, eliminándolos ideológicamente.

Ahora mismo, Joseph Ratzinger desde ese centro de poder político que es "el Vaticano" ha decidido regalarnos a nosotros, "
pu mapuce", un beato con amenaza de trasladarle el título al de santo. Es el mismo Papa manipulador que dijo hace poco que la religión católica no había sido impuesta por la fuerza en nuestras vidas. Sin embargo, necesitó llegar protegida por el ejército comandado por Roca a este territorio.

En sus apenas dos milenios de existencia, para lograr sus objetivos nos "regalaron" el bautismo, los sacramentos, un catecismo lleno de rarezas y misterios, una biblia y algunos libros con incógnitas. Mientras "
pu mapuce", con diez milenios de existencia en cambio, intentábamos mirar lo que esos libros contenían y nos distrajimos. Cuando cerramos esos libros misteriosos y levantamos la vista, nos encontramos como si fuéramos extranjeros, aunque parados en el mismo lugar del que nunca nos fuimos ni nos vamos a ir.

Claro que nos entregaban sus "objetos sagrados" mientras nos apuntaban con armas de fuego. No sabíamos cómo hacer para salvar nuestras vidas y, si eso significaba agarrar lo que nos alcanzaran, lo hacíamos. A la vida siempre hay que preservarla. Por esa estrategia también estamos hoy vivos como pueblos originarios.
Esas armas de fuego son las que nuestra religiosidad nos impide concebir, ya que rompen el equilibrio de la biodiversidad de la que formamos parte, como hombres pertenecientes a la tierra, como mapuches que somos. Porque nosotros no concebimos esas crueles armas ni semihéroes llamados "santos", una especie de personajes literarios que tienen prohibidas las cosas más naturales de la vida, ¡hasta el mismo sexo, que es lo más natural de la naturaleza!

Luchamos contra estas invasiones y no aceptamos este perverso título para un hermano nuestro que murió a manos de la misma colonización. Desterrado de su "
wajmapu" tierra de origen , lo consumió la tuberculosis, esa enfermedad desconocida para nosotros. El método de esa guerra bacteriológica desatada por el ejército nacional contra la familia de Namunkurá era sencilla: liberar a un prisionero mapuche envuelto en mantas infectadas de esa enfermedad contra la cual no teníamos defensa. Hijo de nuestro "Logko Namvnkura", nieto de nuestro Toky Kalfvkura, se lo llevaron vivo a Roma. Como lo devolvieron muerto, para disimular semejante asesinato con pérdida de la identidad incluida ¡le prometieron devolverlo con títulos de semihéroe literario!: que le llamarían beato, que le llamarían santo. Regalos de distracción para el pueblo originario mapuche. Un pueblo que hoy ya no se distrae.

Esta demostración de nuevo engaño desde el Vaticano nos mantiene alertas, incrédulos, elusivos, negándonos a semejantes premios posmortem para nuestros muertos asesinados por ellos mismos.
Nosotros practicamos una filosofía de vida abismalmente distinta y opuesta a ésta, que nos trae de la mano una reivindicación falsa, artificial, impuesta y ajena. Nuestro "NorAdMogen" nos impide faltar el respeto de tal manera a las religiones ajenas.

Nosotros no tenemos santos, tampoco sacerdotes ni brujos. Más allá de que a nuestros médicos o "
maci", a nuestras filósofas o "pillan kuse", a nuestras autoridades originarias, les pusieron nombre de "chamanes". Todo lo tergiversan y todo lo pervierten. El asombro todavía no permite entretenernos con la caricatura que queda de esta manipulación.

Nuestra organización en "
Lofce", como parte de un pueblo preexistente al Estado argentino y a las iglesias impuestas, tiene claridad porque nuestro "rakizuam" o pensamiento circular nos impide levantar a una persona como más santos ni más héroes que otros. Todos formamos parte equilibrada del mismo círculo natural, no hay jerarquías ni menos papas dictadores en nuestro pueblo originario mapuche. Resta que las religiones y leyes usurpadoras de pensamiento, de identidad, de territorios y personas intenten, alguna vez, por una vez, por alguna única vez y para siempre, no faltarnos más el respeto.

JORGE NAHUEL - Werken (portavoz) de la Coordinación de Organizaciones Mapuches - COM (jnahuel@hotmail.com)

O velho cacique geral Namunkurá junto a seu filho Ceferino [Archivo General de la Nación]

Conheça o site The Mapuche Nation , que brinda maiores informações sobre a Nação Mapuche, hoje dividida entre Chile e Argentina.

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