18 de junho de 2009

AcriLírico

"São deuses menos duradouros, os modernos –
Assim como invisíveis os seus templos e altares
Implantados que foram na rede neuronal desta raça
Consumidora em massa de bens descartáveis.

Não são deuses menos justos
Porque justos nunca foram os deuses com a humanidade
E mesmo quando benévolos sempre o faziam por broma
A fim de divertirem-se às custas da ingênua adoração dos mortais:

São deuses construídos à imagem do que não somos,
Prisioneiros que estamos nessa dimensionalidade estreita (e eles não),
E por isso servem como contraste inefável do que ultrapassa o tempo
De nossa existência frágil, mas igualmente esfarelam-se qual pedra em areia.

Nós e nossos laços sanguíneos e ânsia de perpetuidade criamos famílias,
Estabelecemos clãs, tribos, nações, identidades e diferenças entre nó e nó,
Cada qual com seu deus e sua gíria para demarcar os limites e omitir limitações
A partir de individualidades: mas eles nos traíram e se mostraram cegos, surdos e mudos.

Por mais que eu chamasse pelo diabo, só encontraria o diabo que existe dentro de mim.
Esse nem mesmo quer ser um deus, esse se diverte em ser a lei da relatividade, e lhe basta.
O bicho homem, torpe em seu contínuo arar da terra dele farta, suor salgado nos olhos,
Apenas geme suas ideias, seus ideais, acreditando em ideologias que ao final nada são
Senão a distração necessária para compensar dor e prazer
Para que assim a vida lhe seja ou pareça suportável (enquanto dure).

Os novos deuses, estes que não se invocam, cabem em um espaço diminuto de memória:
São focos culturais que pautam o entendimento para os que não o possuem bem certo,
São reciclagens de muitas faces que plasmamos com a força de nossas emoções orgânicas
Que parecem ao leigo o cintilar da faísca da presença do Deus Criador
Mas são rastros de brasa que alguém descobre na madrugada após pisar um fogo morto
E com essas luzes se encanta como se nelas houvesse presenciado desconhecida magia,
São impressões tênues em que nos deparamos dependentes de fugidia força a perseguir.

O dia em que outra força vier a subjugar o que sobrexistiu fugaz nesse planeta,
É aí que isto se anula: deuses abandonados, memórias devoradas, valores descontruídos,
Pedacinho a pedacinho serão esfacelados e não deixarão testemunho algum,
Para que então a raça, a nação, os grandes feitos, tudo passe como um holocausto de Ar,
Como vento leve que adentra com vigor a casa velha e maltratada e parece renová-la
Nos fazendo melhores dentro dela e dentro de nós, mesmo não sendo palpável -
Sorte que refletimos hoje o riso que novas crianças oferecerão, seja sol ou hajam estrelas!..."

16.jun.2009 – de Eduardo Bayer Neto

Acrilírico
(Caetano Veloso/Rogério Duprat)

Olhar colírico
Lirios plásticos do campo e do contracampo
Telástico cinemascope teu sorriso tudo isso
Tudo ido e lido e lindo e vindo do vivido
Na minha adolescidade
Idade de pedra e paz

Teu sorriso quieto no meu canto

Ainda canto o ido o tido o dito
O dado o consumido
O consumado
Ato
Do amor morto motor da saudade

Diluído na grandicidade
Idade de pedra ainda
Canto quieto o que conheço
Quero o que não mereço
O começo
Quero canto de vinda
Divindade do duro totem futuro total
Tal qual quero canto
Por enquanto apenas mino o campo ver-te
Acre e lírico o sorvete
Acrilíco Santo Amargo da Putrificação

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