22 de maio de 2009

A selva peruana loteada


Na recente visita do presidente peruano Alan García a Rio Branco, onde encontrou o presidente brasileiro, assisti na Tv Aldeia (Acre) a entrevista coletiva de ambos. Quando abordado sobre a construção de hidrelétricas como parceria binacional na selva peruana vir a afetar as populações de índios isolados que não tem porta-vozes ou advogados para os defenderem, Lula saiu-se com a frase: "se eles estão do lado do Peru, são peruanos; se estão do nosso lado, são brasileiros". Declaração esta que poderia ser entendida até como incentivo à migração dos isolados peruanos para território brasileiro, onde as populações indígenas são melhor respaldadas pela constituição nacional, caso os isolados tivessem acesso a esse tipo de informação. Sobre as hidrelétricas, Lula disse que o novo modelo proposto para hidrelétricas de selva prevê seu acesso por helicóptero assim como nas plataformas de prospecção de petróleo, o que garantiria "automaticamente" a conservação ambiental de seu entorno. Alan García nem precisou responder a mesma pergunta, pois imediatamente deram por encerrada a coletiva.
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Agora em maio, o Peru decretou "estado de emergência" em quatro estados da Amazônia Peruana: Cuzco, Loreto, Ucayali e Amazonia. Está havendo uma grande disputa nessas regiões entre as companhias petrolíferas e os povos indígenas que habitam as terras em cujo subsolo há abundante fontes de petróleo. A disputa é, com licença do trocadilho, crua e dura. O governo Alan Garcia até que buscou negociar com os índios, mas de um modo tão ineficiente, com tanta incapacidade de conversação, que só causou mais revolta entre as lideranças indígenas. O governo peruano não abre mão do poder sobre a exploração do petróleo outorgada a quem quer que ele queira. Já disse isso diversas vezes. Hoje são pelo menos três locais de poços de petróleo explorados por empresas estrangeiras que foram tomados por índios, além da interdição de diversas pontes e estradas, motivos pelos quais o governo decretou emergência. A principal alegação do governo é que uma minoria de índios não pode prejudicar o Estado peruana e a maioria de sua população que dependem dos royalties e impostos do petróleo. É desculpa muito grosseira.
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O mapa acima, disponibilizado no Blog do Mércio, mostra a divisão geográfica do Peru em três grandes regiões, que correm de norte a sul, e explicita as áreas da Amazõnia Peruana que estão "loteadas" para empresas de petróleo. Não esclarece exatamente onde há terras indígenas, uma concepção bem diferente do que temos no Brasil.
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discurso alberto pizango - declaratoria de insurgencia
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"O Peru não está respeitando a declaração da ONU sobre direitos indígenas", disse na quinta-feira à rádio RPP Alberto Pizango, líder das manifestações e presidente da Aidesep, entidade que reúne grupos ambientalistas e indígenas. A declaração da ONU, que não tem cumprimento obrigatório, foi aprovada em 2007 por 143 países, inclusive o Peru. Pizango chegou a anunciar uma "insurgência" para pressionar o governo a revogar as leis.

Na quinta-feira, depois de políticos acusarem o dirigente indígena de agir como incendiário e de abrirem um processo contra ele por sedição, Pizango disse: "Para nós, insurgência significa defender nossos direitos naturais e resistir pacificamente aos excessos cometidos pelo Estado peruano. Reconhecemos a legitimidade constitucional do governo, mas ele não entende as questões indígenas."

García instituiu a maioria das leis em questão por decreto, aproveitando poderes especiais concedidos pelo Congresso para que ele adéque as leis do país a um tratado de livre comércio com os EUA. Críticos dizem que García aproveitou para adotar medidas que não eram exigidas pelo acordo comercial. Yehude Simon, chefe de gabinete do governo, prometeu a Pizango uma rodada de negociações que possam levar a um acordo que encerre o bloqueio de estradas e portos, que já provoca desabastecimento em algumas localidades amazônicas. A empresa argentina Pluspetrol reduziu sua produção de petróleo na Amazônia devido aos protestos, e a estatal Petroperú paralisou a operação do seu oleoduto.

Até agora, Pizango rejeita as negociações, levando Simon e o resto do gabinete a buscarem um diálogo com outros líderes indígenas, menos influentes. Além disso, o governo declarou um estado de emergência que lhe permite impor toque de recolher e enviar tropas para dispersar protestos. Ao menos por enquanto, o governo se recusa a revogar as leis ou a dar mais controle para os indígenas sobre uma área que representa mais de 60 por cento do país, embora concentre apenas 11 por cento da sua população.

"As terras da Amazônia pertencem... a todos os peruanos, e não só a um pequeno grupo que vive lá", disse García no fim de semana. "As riquezas do Peru pertencem a todos os peruanos."
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Presidentes Lula e Alan García (Peru) durante assinatura de acordos. Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

Fonte: Portal RPC e Centro de Estudos em Sustentabilidade da EAESP

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