29 de julho de 2009

Quando a Noite escapou do Tucumã

Cobra Grande pintada sobre maloca no Alto Rio Negro.
Foto: Beto Ricardo/ISA.

Antigamente, o sol brilhava continuamente e ninguém sabia o que era noite. E, os homens e os animais, viviam juntos e falavam a mesma língua.
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Um jovem guerreiro tupi apaixonou-se por Moiaçu (Mboicunhãmuçu), filha de Mboiguaçu, a Cobra Grande. Logo depois, porém, surgiu um problema. A moça não conseguia dormir e tinha um ar triste e cansado. Julgando que o barulho dos seus criados a incomodava, o rapaz mandou-os à floresta. Mesmo assim, Moiaçu, a moça cobra, não podia repousar. "Não é noite!" Dizia ela. "Nunca é noite! É sempre dia claro!"
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Respondeu ele: "Meu pai tem a noite." O moço chamou os servos e enviou-os à casa do sogro buscar a noite. Os três índios fizeram fogo e colocaram-no em cima de algumas pedras a fim de poder transportá-lo na canoa. Assim poderiam aquecer-se e cozinhar a comida. Empurraram a canoa para o rio e deslizaram pela corrente.
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Quando chegaram, a Cobra Grande entregou-lhes um caroço de tucumã e advertiu-os: "Se abrirem o coco de tucumã, tudo ficará diferente." Os criados começaram a voltar, remando rio acima.
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De dentro do caroço saíam sons esquisitos, de sapos, grilos, corujas, e os ruídos da noite. Ficavam cada vez mais curiosos, mas tinham medo de abrir o coco. Finalmente, não resistiram. O caroço era fechado por um pouco de breu. Derreteram-no no fogareiro.
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De repente, tudo escureceu. A noite tinha escapado. Os pescadores viraram patos, o cesto transformou-se em onça, todas as coisas mudaram. Lá na taba, Moiaçu percebeu o que acontecera e avisou o marido: "Eles deixaram a noite escapar. Vamos esperar o amanhecer."
Ao romper a aurora, no dia seguinte, Moiaçu disse ao marido: "Vou separar o dia da noite." Tomou um fio e fez o cujubim (ou jacutinga, ave da Amazônia). Pintou sua crista de branco com tabatinga (barro branco) e as pernas de vermelho com urucum (fruto do urucuzeiro). Soltou-o, mandando-o cantar toda vez que o sol viesse aparecendo. Com outro fio sujo de cinza, fez o inhambu (ave). Ordenou-lhe que cantasse as horas durante a noite.
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Por sua desobediência, Moiaçu castigou os criados transformando-os em macacos. É por isso, que os macacos tem os beiços pretos e um risco amarelo nos braços. É o breu derretido que escorreu sobre eles, quando abriram o coco de tucumã.
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Fonte: Lendas Indígenas - Gráfica Ed. Aquarela, SP, 1962.

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