Entrevista com Shanê Kaxinawá
Shanê Inu Bake Hunikuin, nos documentos brasileiros registrado como Gustavo Mateus, é um jovem hunikuin que quer estudar em Rio Branco, capital do Acre. Hoje entre uma colherada e outra de chilcano do restaurante peruano da cidade, quis entrevistá-lo:
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Qual o nome da aldeia em que mora sua família?
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- Aldeia São Joaquim no registro da Funai, mas que a gente chama Maloca Hunikuin. Fica a duas horas de subida do rio Jordão a partir da sede do município de Jordão. Lá vive meu pai, Agustinho Manduca Muru, minha mãe Dani ou Mazinilda Sena, e meus irmãos Siã, Isaká, Busam, Itzairú e Aiane.
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Como foi a decisão de você vir pra Rio Branco?
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- A primeira vez eu planejei com meus outros irmãos, porque meu pai tem muitos amigos aqui e já viajou por vários lugares. Aí precisamos ter um lugar pra vender nosso artesanato, e conversei com o prefeito do município que organizou pra nós chegar em Tarauacá, e de lá o governo ajudou a vir pra Rio Branco de avião. Fiquei seis meses e meu pai e meus irmãos viajaram pra São Paulo e Rio de Janeiro pra vender artesanato. Aí na volta fiquei cinco meses na casa da amiga Marinete estudando computação. Isso foi em 2007. Agora estamos vendo de colocar a nossa própria loja, porque fui escolhido pela Federação Hunikuin para negociar com os produtos da nossa cultura.
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Você se adaptou fácil à vida da cidade? Sente falta da vida na aldeia?
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- Aqui em Rio Branco a principal dificuldade é que tudo a gente tem que ter dinheiro. Já fui no Rio de Janeiro, fiquei uns vinte dias na casa do meu primo Banê que mora lá, achei legal, gostei de conhecer o mar, já logo que cheguei fui lá ver a praia, mesmo de noite. Aqui o que acho falta da aldeia é nadar no rio, caminhar na mata, as festas da nossa cultura, mas aqui tem mais condições de estudar então eu me esforço pra ficar.
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Como está o movimento do artesanato do Jordão?
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- Aqui estamos organizando. Primeiro quem trouxe foi o Siã (Osair Sales), depois ficou parado, nem o couro vegetal que foi um bom negócio a gente tá produzindo mais. Precisamos de novos projetos, eu mesmo estou com um grupo de quinhentos jovens pra produção do artesanato, e minha irmã Aiane foi indicada pela comunidade pra organizar os grupos de mulheres também. Então agora aqui em Rio Branco temos bolsas, faixas, tapetes, cestos, pulseiras, colares, e lá no Jordão os jovens estão produzindo flexas, bordunas, flautas e maracás. Queremos colocar na internet um catálogo dos nossos desenhos chamados kenê e das cores que tingimos a linha com pigmentos naturais, pra poder receber encomendas de peças pra decoração de casas também, como cortinas, toalhas de mesa, capas de almofada e colchas de cama, do tamanho e nas cores que o cliente quiser comprar.
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E o kambô, você aplica também?
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- Kampum, que a gente chama, eu aplico também. Na época das chuvas aqui o kampum canta e aí a gente acha ele fácil pra tirar o "shuku", daí a gente deixa secar nas varinhas e daí pode guardar uns seis meses, servindo pra várias aplicações. Aqui em Rio Branco as próprias pessoas procuram a gente pra receber o kampum.
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Como você vê o movimento indígena aqui no Acre?
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- Tem muitos jovens estudando aqui em Rio Branco, jaminawás, manchineris, apurinãs, dentre outros. Eu não sei como eles passam porque o apoio do governo é fraco, e pra sobreviver tem alguns que eu vejo tirando coisas do lixo, o que é muito triste pensando em como nas aldeias a gente tem de tudo. Tem ongs como a CPI que dão curso pra formação de professor, de enfermeiro... Eu fiz curso no Sebrae também pra trabalhar produtos, formar empresa, e agora estudo música na Usina de Arte com o professor Roberto, e está sendo bom..
Você tem vinte anos de idade, como você espera que seja o seu futuro e o dos seus parentes hunikuins?
- Vejo que agora a gente tá melhorando, antes teve massacre e perseguição quando os brancos chegaram, mas graças aos meus parentes como Suero, meu pai Muru, Getúlio e Siã, agora temos nossa terra, tem trinta aldeias só no Jordão (Alto Jordão, Baixo Jordão e Seringal Independência) e cada aldeia está fazendo sua cupixaua, trabalhamos pelo resgate da nossa cultura. Meu pai mesmo é representante da pajelança das três terras indígenas do Jordão, estamos trabalhando com o pessoal de lá fazendo curas e ensinando nossas histórias para as crianças de lá, e quero que nosso trabalho de comercialização do artesanato permita a gente ficar mais unido dos outros kaxinawás, como os do Envira, do Humaitá, do Purus, e também os que estão no Peru.
Para ver fotos do Katxátirim, clique aqui. Contatos com Shanê pelo e-mail: shanehunikui@gmail.com
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