1 de maio de 2008

Um Índio


Um índio

Um índio descerá de uma estrela colorida brilhante
De uma estrela que virá numa velocidade estonteante num claro instante
Depois de exterminada a última nação indígena
E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida
Mais avançado que a mais avançada das mais avançadas tecnologias
Virá
Impávido que nem Muhammad Ali
Virá que eu vi
Apaixonadamente como Peri
Virá que eu vi
Tranqüilo e infalível como Bruce Lee
Virá que eu vi
O aché do afoxé Filhos de Gandhi
Virá
Um índio preservado em pleno corpo físico
Em todo sólido todo gás e todo líquido
Em átomos palavras cor em gesto em cheiro em sombra em luz em som magnífico
Num ponto eqüidistante entre o Atlântico e o Pacífico
Do objeto sim resplandecente descerá o índio
E as coisas que eu sei que ele dirá não sei dizer assim de um modo explícito
Virá
Impávido que nem Muhammad Ali
Virá que eu vi
Apaixonadamente como Peri
Virá que eu vi
Tranqüilo e infalível como Bruce Lee
Virá que eu vi
O aché do afoxé Filhos de Gandhi
Virá
E aquilo que nesse momento se revelará aos povos
surpreenderá a todos não por exótico
Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto quando terá sido o óbvio.

(Caetano Veloso)

A aventura dos Doces Bárbaros começou em 1976 quando Maria Bethânia, Gilberto Gil, Gal Costa e Caetano Veloso, em comemoração a 10 anos de carreiras individuais de sucesso, formando um conjunto que se apresentaria nas principais cidades brasileiras. O filme de Tom Job Azulay lançado dois anos depois narra os shows e revela o processo criativo dos artistas através de bem humorados, mas exaustivos ensaios. Em 1978, a ditadura militar comandava (?) o Brasil com mão pesada, e a censura, com seus critérios esdrúxulos, agia em todos os meios de comunicação. Parece um passado distante.

"Era praxe ir a Brasília conversar com a censura quando se lançava um filme", diz o diretor de "Os Doces Bárbaros", Tom Job Azulay, 62, que registrou a turnê do grupo formado por Gal Costa, Maria Bethânia, Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Segundo ele, foram cortados cerca de 10 minutos de filme (cerca de 10% do total). "Mas eu não cortei o original, só as cópias". Por isso o filme foi relançado com as cenas censuradas, que tratam da prisão de Gilberto Gil e do baterista Francisco Azevedo, o Chiquinho, por porte de maconha em Florianópolis em 1976.

Leia abaixo as frases que o governo militar julgou "impróprias" para menores de 14 anos. Com os cortes, a censura classificou o filme de "boa qualidade, livre para exportação".

# Gilberto Gil é entrevistado no quarto da clínica psiquiátrica após ser preso por porte de maconha em Florianópolis e diz: "... E por isso mesmo e por exatamente ver dessa forma, eu tenho a impressão que nada disso pode nos abalar muito, quer dizer, pode nos abalar além, digamos assim, das superfícies do corpo e da alma, porque no fundo mesmo, do espírito da gente, a gente tá forte."

# Gil: "A gente tá seguro, eu acho que o Chico (o baterista preso com Gil) também pode falar, né? eu acho que..."
Chico: "Eu tô bem seguro, fui muito bem tratado. A gente ficou muito junto da verdade e acho que isso ajudou muito a gente."
Gil: A gente tá aí, a gente não tem vergonha de nada, a gente não tem dúvida a respeito do que a gente é... A gente é isso, somos pessoas de hoje, século 20, 76, após-calispo, né?" (da letra de "Chuck Berry Fields Forever")

# Gil: "...A gente tá vivendo momentos em que se buscam uma descontração no mundo inteiro com relação a novos atos, a formação de novos padrões, de novos conceitos sobre atitude social, sobre comportamento particular, quer dizer, sobre privacidade, quer dizer, sobre respeito à vida privada das pessoas e tudo mais."

# Juiz lê as declarações de Gil para o escrivão durante o julgamento do cantor: "Abre aspas. Gostava de maconha e que seu uso não lhe fazia mal nem lhe levava a fazer o mal. Fecha aspas. Em juízo, Gilberto Gil declarou que o uso da maconha, abre aspas, o auxiliava sensivelmente na introspecção mística. Fecha aspas".

Fonte: UOL Cinema e Cogumelomoon

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